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COMO O MERCADO DE CARBONO PODE ESTIMULAR A CONEXÃO ENTRE FRAGMENTOS FLORESTAIS NOS BIOMAS BRASILEIROS

    Por Humberto Amaral Neto¹

    O mercado de carbono, em suas vertentes voluntária e regulada, constitui hoje uma das principais arenas de articulação entre economia, direito ambiental e conservação da biodiversidade.

    No Brasil, sua interface com a Lei Florestal de 2012 é central: a norma estabelece a obrigatoriedade de manutenção de Reservas Legais (RL) — frações mínimas de vegetação nativa que variam conforme o bioma — e de Áreas de Preservação Permanente (APP), com destaque para matas ciliares, encostas e topos de morro.

    Embora os mecanismos de compensação e regularização ambiental ofertem instrumentos jurídicos para recompor passivos, o mercado de carbono amplia esse horizonte, permitindo que a manutenção e a restauração dessas áreas sejam convertidas em ativos econômicos.

     Assim, fragmentos antes isolados podem ser reconectados, tanto ecologicamente quanto financeiramente, por meio de fluxos de crédito que valorizam a permanência do carbono estocado e a integridade do território.

    O obstáculo, ainda assim, permanece nas paisagens rurais. Há propriedades que, embora formalmente cumpram a exigência de Reserva Legal e APP, apresentam baixa diversidade ecológica, seja pelo histórico de degradação, seja pela adoção de modelos simplificados de recomposição.

    Por outro lado, persistem propriedades que ainda não se ajustaram à Lei Florestal, mantendo passivos significativos em relação à vegetação nativa. Essa dualidade cria uma tensão produtiva: de um lado, o risco de tratar a conformidade apenas como cumprimento mínimo da lei; de outro, a possibilidade de engajar instrumentos de mercado que valorizem a qualidade ecológica das áreas conservadas.

    Reconectar fragmentos, nesse cenário, não significa apenas cercar e regenerar, mas pensar em corredores funcionais que elevem o valor da paisagem como um todo.

    É nesse ponto que as metodologias de certificação de créditos de carbono se tornam mais do que protocolos técnicos: operam como mediadoras de uma compreensão ampliada da biodiversidade.

    Ao exigir planos de monitoramento, indicadores de diversidade e práticas de manejo, essas metodologias incentivam que as propriedades rurais incorporem dimensões como restauração florestal ativa, educação ambiental voltada a comunidades locais e estratégias preventivas de combate a incêndios.

    Nesse sentido, o mercado de carbono pode se consolidar não apenas como arena de negociação financeira, mas como indutor de políticas territoriais que favoreçam a conectividade entre fragmentos, ampliando a resiliência ecológica dos biomas brasileiros e transformando a conservação em um projeto coletivo de longo prazo.


    Humberto Amaral Neto, Engenheiro Florestal, parceiro do Instituto Tecnoarte.