Por Francisco Pontes de Miranda Ferreira¹ e Thais Helena Alexandre Marinho²
Fotografias de Maria Eduarda Moreira
Os manguezais de Itacuruçá e da Gamboa, em Mangaratiba (RJ), são muito mais do que ecossistemas costeiros: são o coração da cultura caiçara e da subsistência de famílias que há gerações vivem em harmonia com a natureza. Mas agora, essas comunidades enfrentam um desafio que coloca em risco seu modo de vida e a própria preservação ambiental.
O Impasse: Parque ou Reserva?
A proposta da Prefeitura de criar o Parque Municipal Mangue Itacuruçá e Mangue da Gamboa — uma unidade de proteção integral — acendeu o alerta entre os moradores. Embora bem-intencionada, essa medida pode transformar práticas tradicionais como a pesca artesanal e a coleta de mariscos em atividades ilegais, excluindo quem sempre cuidou do território.
Segundo o Instituto Permamar, organização comunitária que lidera a mobilização, “o modelo de parque restringe o uso sustentável e o extrativismo tradicional, ameaçando a permanência das famílias locais”.

Quem Protege o Mangue?
As comunidades caiçaras defendem que são as verdadeiras guardiãs dos manguezais. Com práticas sustentáveis e conhecimento ancestral, elas mantêm o equilíbrio ecológico da região. A proposta alternativa é a criação de uma Reserva Extrativista Marinha (Resex) — uma unidade de conservação que une proteção ambiental e garantia de direitos.
A Resex permite o uso sustentável dos recursos naturais por populações tradicionais, valorizando quem depende da saúde do ecossistema para viver.
Base Legal e Técnica
A luta caiçara é respaldada pela Convenção 169 da OIT, que garante o direito à consulta prévia às comunidades tradicionais. Estudos acadêmicos também reforçam a importância da gestão comunitária para a conservação, como aponta o Atlas da População Costeira do Brasil (2023).
Caminhos para a Conciliação
Diante da complexidade territorial — que envolve áreas públicas e privadas — surge a proposta de uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS). Essa categoria permite uma gestão compartilhada e multiterritorial, conciliando conservação, uso sustentável e interesses privados.

Exemplos que Inspiram
Experiências bem-sucedidas como as Resex de Arraial do Cabo (RJ), Canavieiras e Corumbau (BA) mostram que a gestão comunitária pode fortalecer a economia local e proteger o meio ambiente. Em Mangaratiba, a mobilização integra a Rede pela Biorregião Costa Verde, que defende a conservação com protagonismo dos Povos do Mar.
Por um Território do Bem Viver
A proposta do Instituto Permamar é clara: suspender a criação do parque até que haja consulta pública adequada e instaurar um estudo técnico participativo para a criação da Resex Marinha de Mangaratiba. Como destaca Thaís Marinho, “a melhor estratégia para proteger um território é apoiar quem já o protege, há gerações”.
Referências
- ACOSTA, A. O bem viver. São Paulo: Editora Elefante, 2019.
- BRASIL. Lei n. 9.985 de 18 de julho de 2000. Ministério do Meio Ambiente, 2000.
- FERREIRA, F. P. M. Territorialidades socioambientais em Teresópolis-RJ. Tese de Doutorado. UERJ, 2023.
- HAESBAERT, R. O mito da desterritorialização. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.
- LITTLE, P. E. Territórios sociais e povos tradicionais no Brasil. Anuário Antropológico, vol. 28, n. 1, 2003.
- PRATES, M. L.; FORTUNATO, R. A.; SIMON, A. V. S. Territorialidades Socioambientais no Parque Estadual Costa do Sol. Ed. Iole, 2025.
📌 Este conteúdo é uma adaptação autorizada da reportagem original de Francisco Pontes de Miranda Ferreira e Thais Helena Alexandre Marinho, publicada com direitos reservados. Para mais informações sobre o Instituto Permamar e a mobilização caiçara, acesse institutopermamar.org.
¹Francisco é Doutor em ciências do Meio Ambiente, Diretor Interinstitucional do Instituto Tecnoarte e Jornalista.
²Thais Marinho, bióloga, fundadora e gestora do Instituto Permamar
